Manter um físico seco e definido, com baixíssima massa gorda, é insustentável e pode até prejudicar a tua saúde e crescimento. Descobre toda a verdade!

Riscos de manter uma % de massa gorda baixa muito tempo

Estar com um corpo definido, com uma percentagem de massa gorda baixa e os contornos musculares bem delineados é o gold standard do corpo fitness.

É aquilo que a maioria procura e define como o “corpo de verão”.

E é aquilo que vemos e idolatramos diariamente nas redes sociais, televisão e revistas.

Mas também é algo que inúmeros atletas, cientistas e treinadores afirmam que é insustentável.

Por não ser uma condição saudável para manter o teu corpo, principalmente se falarmos de físicos de competição.

E por te deixar numa posição pouco condutiva ao teu crescimento.

Mas será isto verdade?

Hoje vamos analisar a realidade fisiológica e psicológica de manter um corpo com uma percentagem de massa gorda baixa.

ESTAR “SECO/A” O ANO TODO… SIM OU NÃO?

Antes de avançarmos mais neste artigo, quero definir este estado de “seco”, “definido” ou de “baixa percentagem de gordura”.

Como um corpo abaixo dos 8% de gordura para os homens e 18% de gordura para as mulheres.

Onde a definição muscular é evidente em qualquer luz, sem precisar de poses específicas ou grandes contrações musculares.

E onde nos começamos a aproximar de um físico apto para uma competição de culturismo se perdermos mais uns 3-4% de gordura corporal.

Posto isto, é preciso entender que não há duas sem senão.

Primeiro:

Atingir a percentagem de gordura corporal que te traz a tua definição ideal não é tarefa fácil.

Envolve um grau elevadíssimo de rigor com o treino e alimentação para queimar a gordura que precisas para lá chegar. E um desafio sério para o teu corpo.

Segundo:

Se queres manter esse físico pelo qual tanto trabalhaste… o esforço não acaba aí.

Para suster esse físico terás de manter uma disciplina sob o exercício e a dieta que te permita sustentar tal condição corporal.

E manter o corpo num estado desfavorável a nível fisiológico, comprometendo funções imunitárias, hormonais, psicológicas e muito mais.

Mas o que é que acontece realmente quando nos aproximamos de percentagens de gordura tão reduzidas? E porque é que é tão desvantajoso manter esta condição física tão estética?

DISPONIBILIDADE ENERGÉTICA

Quando falamos de secar e atingir uma definição corporal invejável – falamos de passar por um processo de défice calórico.

Uma condição impreterível para o emagrecimento/queima de gordura.

Aqui, submetemos o corpo a um estado de escassez energética para que este seja obrigado a utilizar as suas reservas de gordura para suster as suas atividades.

Mas embora esta decisão dietética nos aproxime de um corpo mais estético… é uma condição que acarreta consequências.

Nomeadamente ao nível da disponibilidade energética, visto que estamos efetivamente a restringir calorias (energia) para queimar gordura corporal.

O que nos leva ao RED-S (relative energy deficiency in sport) que descreve a perda de funções fisiológicas como:

  • Descida da tua taxa metabólica – gastando menos calorias por dia;
  • Alterações no teu perfil hormonal – levando ao decréscimo de hormonas anabólicas como a testosterona e desregulação das hormonas tiroideas alterando a tua fome e repartição de nutrientes;
  • Alterações na menstruação.
  • Perda de capacidade de síntese proteica – reduzindo o teu crescimento e recuperação muscular.
  • Redução da saúde cardiovascular. (1).

E estas são condições que se desenvolvem à medida que restringes o teu aporte de calorias e nutrientes – o que acontece durante uma dieta para queimar gordura.

Este termo RED-S é descrito com base na relação entre o teu aporte de calorias e a tua massa magra. Considerando-se arriscado para desenvolver estes sintomas quando consomes menos de 30 kcal por cada kg de massa magra por dia. (2-4).

E, sendo sincero, é muito comum vermos atletas de bodybuilding a ir muito abaixo destas 30 kcal/kg MM/dia durante uma preparação para competição.

E até mesmo em atletas recreativos em fases de perda de peso quando têm um dia-a-dia mais sedentário e/ou querem atingir uma % de massa gorda baixa para ter um corpo mais estético.

RESUMINDO

À medida que segues uma dieta para perda de peso e restringes as calorias e nutrientes que proporcionas ao teu corpo para queimar gordura – vais ter cada vez menos disponibilidade energética.

Gradualmente, e à medida que inevitavelmente reduzes o aporte calórico para continuar a queimar gordura, é natural que te aproximes de < 30 kcal / kg MM / dia e comeces a experienciar os vários sintomas associados à RED-S.

TERMOGÉNESE ADAPTATIVA

Certamente já ouviste dizer que o teu metabolismo se adapta à tua dieta – tornando-se cada vez mais difícil perder peso.

Por isso é que, normalmente, acabas por ter de reduzir mais e mais as calorias (ou aumentar o cardio) à medida que perdes peso – para continuares a conseguir emagrecer ao ritmo que pretendes.

A este fenómeno chamamos Termogénese Adaptativa.

Que contempla as várias reações fisiológicas do corpo perante um aporte calórico fora da manutenção/homeostasia. (5-6).

Ajudando o corpo a “combater” este “empurrão para uma direção diferente”. Seja para emagrecimento num défice calórico, seja para ganho de peso num excedente calórico.

Neste caso, quando falamos de queima de gordura e défice calórico, a termogénese adaptativa leva-te a queimar cada vez menos calorias e a ter dificuldade em queimar gordura.

Fisiologicamente, trata-se de (6):

  • Aumento da eficiência energética do músculo esquelético – fazendo com que gastes menos calorias por cada ação feita (ex: no treino).
  • Redução da atividade do sistema nervoso simpático – tornando-te menos predisposto à atividade física no dia-a-dia
  • Aumento da atividade do sistema nervoso parassimpático – “deixando-te mais mole”
  • Redução da atividade hormonal hipotalâmica, pituitária, tiroidea e gonadal – aumentando a fome, reduzindo a saciedade e atenuando a tua predisposição para o exercício físico.
  • Redução da produção de hormonas sexuais (como a testosterona).

MASSA GORDA BAIXA… RESUMINDO

O processo até chegares a uma massa gorda baixa (e ainda mais até chegares a um corpo de competição) requer uma séria redução do aporte calórico.

Esta redução/défice calórico deixa-te exposto(a) à adaptação termogénica – que se mantém durante toda a dieta.

Vais queimar cada vez menos calorias, obrigando-te a comer cada vez menos calorias para conseguires continuar a queimar gordura.

Ao teres de reduzir o teu intake calórico face à adaptação termogénica acabarás por entrar numa situação de baixa disponibilidade energética. O que te pode trazer todos aqueles sintomas indesejados para a tua saúde, físico e cabeça.

E isto funciona em bola-de-neve: Quanto mais tempo estiveres em défice calórico e/ou maior for a perda de gordura, maior será a adaptação termogénica e maior será a tendência para agravar a disponibilidade energética.

E mesmo quando chegares ao teu “novo corpo” – com a % de massa gorda baixa que tanto procuras – as tuas calorias de “manutenção” estarão altamente deflacionadas por todas estas adaptações.

A adaptação termogénica pode perdurar mesmo durante a manutenção do novo peso (5, 6)

O que significa que, muito possivelmente, as tuas calorias de manutenção com um %MG baixíssima poderão estar abaixo da disponibilidade energética ideal.

Fazendo com que manter esse corpo não seja o ideal para ti.

Com baixa energia, testosterona, imunidade, …

O QUE FAZER?

Sinceramente… és livre de fazer o que quiseres, claro.

Se queres estar seco(a) durante todo o ano – força! Não sou ninguém para te parar.

No entanto, deixo-te aqui algumas recomendações para que consigas orientar o teu “calendário” de percentagem de gordura:

1. Se não vais competir – não chegues a percentagens de gordura tão extremas.

Não há literalmente nada a ganhar, exceto fotografias.

Porque fisiologicamente deixarás o teu corpo de rastos e, muito provavelmente, terás uma recaída pós-competição onde irás acumular imensa gordura desnecessária.

2. Se queres estar numa percentagem de gordura “insustentável” para ti – guarda-a apenas para as alturas estritamente “necessárias”.

Ter os abdominais definidos deixa-te com uma fome incontrolável? Demasiado foco na alimentação? Baixa energia ou libido?

Mas queres mesmo muito exibir esses abdominais na praia?

Então fica apenas com essa %MG durante o período de praia / quando queres estar com essa condição física.

E, assim que possível, regressa ao teu bulking para voltar a crescer ao máximo e manter a tua saúde no ponto.

CONCLUSÃO

Infelizmente, manter aquele corpo seco e definido que todos gostamos não é nada amigável para o corpo.

É verdade que há uma enorme diferença entre indivíduos face à experiência e dificuldade que têm com este tipo de condição física. No entanto, os sintomas são inevitáveis e praticamente transversais.

Para os atletas recreativos, com uma boa alimentação e periodização dietética poderás conseguir chegar a níveis de definição brutais com o mínimo de repercussões. Mas será um processo detalhado e controlado, exatamente para garantir a máxima eficácia e preservação da tua massa muscular e bem-estar.

Para os competidores… é um mal inevitável. E o ideal é tentar voltar a uma %MG saudável o mais depressa possível após a competição – para ajudar a reverter todos os sintomas desenvolvidos nas últimas semanas de preparação.

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Bons treinos – e não te esqueças:

REFERÊNCIAS
  1. Mountjoy, M., Sundgot-Borgen, J. K., Burke, L. M., Ackerman, K. E., Blauwet, C., Constantini, N., Lebrun, C., Lundy, B., Melin, A. K., Meyer, N. L., Sherman, R. T., Tenforde, A. S., Klungland Torstveit, M., & Budgett, R. (2018). IOC consensus statement on relative energy deficiency in sport (RED-S): 2018 update. British journal of sports medicine, 52(11), 687–697. https://doi.org/10.1136/bjsports-2018-099193
  2. Loucks A. B. (2004). Energy balance and body composition in sports and exercise. Journal of sports sciences, 22(1), 1–14. https://doi.org/10.1080/0264041031000140518
  3. Loucks A. B. (2003). Energy availability, not body fatness, regulates reproductive function in women. Exercise and sport sciences reviews, 31(3), 144–148. https://doi.org/10.1097/00003677-200307000-00008
  4. Burke, L. M., Lundy, B., Fahrenholtz, I. L., & Melin, A. K. (2018). Pitfalls of Conducting and Interpreting Estimates of Energy Availability in Free-Living Athletes. International journal of sport nutrition and exercise metabolism, 28(4), 350–363. https://doi.org/10.1123/ijsnem.2018-0142
  5. Rosenbaum, M., Hirsch, J., Gallagher, D. A., & Leibel, R. L. (2008). Long-term persistence of adaptive thermogenesis in subjects who have maintained a reduced body weight. The American journal of clinical nutrition, 88(4), 906–912. https://doi.org/10.1093/ajcn/88.4.906
  6. Rosenbaum, M., & Leibel, R. L. (2010). Adaptive thermogenesis in humans. International journal of obesity, 34(1), S47-S55.

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